S. Tomas - Comentário ao De Anima (Cap 3-4) de Aristóteles
>> quinta-feira, 5 de junho de 2014 –
Filo Medieval
Ambos os textos tem como objeto de
análise a alma humana, ainda que sob perspectivas diversas. Podemos notar uma
relação mais direta entre os textos de Aristóteles e S. Tomás, o que é óbvio,
uma vez que o santo comenta justamente a obra do filósofo. Podemos, porém notar
uma certa continuidade e mesmo um certo aprofundamento realizado por Edith
Stein, dado o seu diverso contexto, meios e finalidade.
No
terceiro capítulo de De Anima
Aristóteles continua a tratar a natureza da alma em diálogo com os filósofos
precedentes. A perspectiva da análise da alma humana é o movimento, na verdade o filósofo se propõe a investigar a
possibilidade ou não de movimento da alma, destacando a quais tipos de
movimento se refere: deslocação, alteração, perecimento e crescimento, verificando
se alguns deles se aplica a alma.
Assim,
primeiramente relata as opiniões dos outros filósofos mostrando quais deles
mantiveram um método para investigar a alma e posteriormente mostra de que modo
diversos filósofos chegaram a diferentes opiniões sobre a alma. Aristóteles
procura verificar se o movimento é caraterística da alma, e se sim, se é por
essência que a alma se move ou faz mover o corpo, bem como as consequências
dessa constatação, como por exemplo, no caso do movimento pertencer a alma por natureza,
implica que esta ocupe um lugar, espacial.
Não
concorda com a concepção de que a alma se move a si mesma por essência, bem
como não está de acordo em ser a alma a mover o corpo, dadas as consequências
de tais afirmações, como por exemplo o fato de que em tal caso a alma ao se
mover ou mover o corpo e deslocar-se implicaria, sair e entrar novamente no
corpo, porém ao sair implicaria a morte do “animal” e ao re-entrar a sua
ressurreição, o que resulta a tese absurda, ao mesmo tempo nos faz pensar a profundidade
de sua análise que como pano de fundo traz uma certa ideia de que a alma seja
um princípio que informa ou dá a vida ao corpo. Então conclui que a alma não
possui um movimento próprio por natureza, mas por acidente.
No
que se refere ao método, nos fica evidente a abordagem dedutiva do filósofo,
partindo da observação, contemplação da realidade, bem como o sua forma
dialógica de fazer filosofia, sempre considerando a opinião dos filósofos
anteriores. Podemos notar, como em suas outras obras, como Aristóteles é um
modelo de filósofo como também de mestre, considerando sempre o contexto em que
se movia seus discípulos.
Nessa perspectiva segue o comentário
de S. Tomás à obra de Aristóteles, afirmando que chegamos ao conhecimento do que é imanifesto através daquilo que é
manifesto, dizendo serem dois os manifestos pelos quais os animados se
distinguem dos inanimados, a saber, o sentir
e o ser movido. Destaca que, segundo
Aristóteles, os filósofos antigos se dividiam em diversas opiniões sobre como
chegar ao conhecimento da alma, resumindo em dois caminhos: através do
movimento e através da sensação (cognição). Assim a análise da natureza da alma
segue a partir da perspectiva do movimento. Entre os filósofos que trataram a
natureza da alma a partir do movimento, apresenta a opinião de Demócito, o qual
dizia “ser a alma um certo fogo ou calor”,
para em seguida apresentar a opinião dos pitagóricos, para os quais a alma são
corpos indivisíveis e infinitos ou aquela virtude que move aqueles corpos
indivisíveis e infinitos.
Passando a comentar a opinião de
Anaxágoras, que tomará a maior parte do terceiro capítulo, S. Tomás não apenas
expõe sua opinião como a utiliza para contrapor àquela de Demócrito, para quem
a alma e o intelecto são o mesmo. No fim do capítulo o doutor angélico diz que
Aristóteles mostra em que se distinguia Anaxágoras e Demócrito, considerando a
opinião de Anaxágoras e reprovando aquela opinião.
Como
foi visto, Santo Tomás no terceiro capítulo trata do conhecimento da alma a
partir do movimento, já no quarto o conhecimento da alma vem analisado a partir
da sensação ou cognição e isso de dois modos: demonstrando em que concordam os
filósofos que consideraram a alma a partir da sensação e em que divergem.
Considerando a sensação todos reconhecem a alma a partir de princípios, porém
para alguns os princípios são muitos e para outros um único princípio.
A semelhança da coisa conhecida se
dá no cognoscente, então a tese se desenvolve a partir da ideia de que se a
alma tudo conhece é porque possui nela própria a semelhança de tudo conforme o
ser natural. Contudo, para o doutor angélico, os filósofos não distinguiram o
modo pelo qual uma coisa se distingue apenas no olho ou intelecto ou na própria
coisa (in se ipsa). Considerando
especialmente a opinião de Empédocles, a alma humana seria constituída de
elementos, que são também princípios, e para ele são propriamente seis, 4
materiais (terra, água, ar e fogo) e 2 ativos-passivos (amizade e desavença).
Em seguida detendo-se sobre os
discursos de Platão, segue-se uma tentativa exaustiva de descrição sobre o
processo de conhecimento da alma e afirma que o filósofo também considerava a
alma a partir de princípios, dos quais seguem-se dois elementos ou princípios
das coisas, o mesmo, do qual advém os imateriais e o diverso, do qual advém os materiais, de
ambos procede a alma.
A
partir da análise do segundo discurso de Platão estabelece que as realidades
inteligíveis são por si subsistentes e separadas sendo sempre em ato e
principalmente, a ideia de que são a
causa da cognição e ser das
coisas sensíveis, que segundo Tomás, para Aristóteles constitui o intelecto
agente. Então existe um duplo modo de abstração através do intelecto, dos
particulares aos universais e matemática das coisas sensívies.
Analisando
o terceiro discurso trata das potências da alma para apreensão do ente:
intelecto (apreensão), ciência (1ª dualidade), opinião (1ª trindade), sensação
(1ª quaternidade). Já no final do quarto capítulo afirma que existiram os
filósofos que chegaram à cognição da alma a partir do movimento e da sensação
simultaneamente.
Uma semelhança significativa que nos
salta aos olhos entre Aristóteles e S. Tomás de Aquino é que ambos, antes de
apresentar teorias sobre quaisquer temas, sempre parte primeiro de uma pesquisa
sobre o que estudou outros filósofos, buscando ser intérprete fiel, bem como
analisando concordâncias e contradições em cada pensamento, para depois sim,
apresentar uma visão que lhes sejam próprias.