Porfirio - Carta a Marcela
>> domingo, 10 de novembro de 2013 –
FILO ANTIGA
(Resumo)
Porfírio foi um importante discípulo de Plotino, de
quem foi o responsável por escrever uma biografia e organizar seus escritos
(Enéadas). Pode ser considerado neo-platônico,
dividia a filosofia em ética, física e metafísica, que seria uma espécie de
saber contemplativo concernente aos mistérios a ao cume do saber. Para ele, o
escopo da filosofia é a união com Deus, o que dá ao seu pensamento um certo cunho religioso,
como se nota na Carta a
Marcela. Na leitura dessa Obra se pode notar que para ele a filosofia
apresenta um caráter minoritário e de certa forma elitista. Vale lembrar ainda
que é um defensor do paganismo e forte crítico do cristianismo, do qual chegou
a escrever uma obra contra. O motivo principal de sua crítica pode ser
compreendido através da sua concepção filosófica de Deus, de tal forma
superior, que não poderia se encarnar e mesmo se revelar ao homem.
A carta a Marcela tem caráter sapiencial é de
consolação à sua esposa, que está sujeita à sua ausência e ao mesmo tempo um
convite à sua “ascese religioso-filosófica”, expõe ainda seu pensamento ético.
Deixa claro também que a filosofia exige não somente o empenho da razão, como
também o exercício da fé, do conhecimento, da esperança e do amor, aqui não
entendido em sentido cristão e sim platônico, amor que eros e não ágape.1
Enquanto os pensadores cristãos da época, recorriam
aos filósofos clássicos para demonstrar a reacionalidade das verdades
reveladas, os filósofos pagãos, também Porfírio, recorriam a eles e a uma certa
autoridade da fé para afirmar suas convicções racionais. Na Obra fica ainda
claro um certo apreço à piedade greco-romana, “este é o maior fruto da
piedade: honrar a divindade, segundo o costumes dos pais.” 2
A sua metafísica fica evidente na obra em diversos
trechos e é determinante para suas convicções filosóficas, entre elas a de que
Deus não poderia se encarnar, pois no cume do ser está o UNO, que é
absolutamente incorpóreo, está presente em todas as partes, sem se confundir
com nenhuma. Abaixo do Uno está a “inteligência”, que procede do Uno e é também
incorpórea simples e indivisível, nela se contém o mundo inteligível das
ideias. Da “inteligência” procede a alma do mundo, que é já, composta e móvel e
apresenta duas partes, uma primeira que se identifica com o demiurgo de Platão
e uma outra inferior, na qual estão todas as almas particulares que procedem
dela, sem dividi-la e nem destruir sua unidade e debaixo das almas estão a
matéria e os corpos. Vale ressalvar que
Porfírio introduz algumas transformações em relação à metafísica de Plotino,
não se limitando a simplesmente a repropor a sua doutrina.
Assim, a consequência natural é uma visão demasiado
pessimista do corpo e de suas realidades, justificando assim o tema fundamental
da sua moral, a salvação da alma que se dá mediante o asceticismo, a
purificação e ao conhecimento de Deus. Logo, a alma deve libertar-se do corpo e
de todas as suas paixões, a fim de retornar ao seu primeiro princípio, suprimir
as paixões, seria uma espécie de morte filosófica ainda mais eficaz que o
suicídio logrado por Sêneca, por exemplo.
O prontuário moral apresentado por Porfírio nessa
obra é elaborado com base na filosofia pitagórica extraída de Platão, que
sintetiza aquilo que ele considerava melhor das tradições greco-romana e parece
pretender oferecer um estilo de vida sapiencial e religioso diverso ao
cristianismo, que se difundia tanto.
A Obra apesar de não apresentar uma doutrina
rigorosa sobre Deus e sobre o homem, traz certamente a fusão de dois elementos,
a piedade tradicional greco-romana, com a teologia metafísica de Porfírio, pois
introduz nessa piedade e culto um novo fundamento, que advém da sua especulação
filosófica neo-platônica. Assim, a alma das práticas religiosas é a filosofia e
“somente o sábio é sacerdote, somente ele é querido por Deus e somente ele
sabe rezar.3” Uma piedade sem filosofia seria vazia e mesmo nociva.
A queda da alma no devir vem recordada por Porfírio
à sua esposa e toda a ascese que propõe consiste de certa forma em recuperar a
união com o Uno, o meio para tal consiste em purificar-se, libertar-se das
paixões e sofrer4,
tal esforço será premiado com a visão de Deus e com a união com Ele já nesta
vida, pois apesar da queda no devir, alma conserva sempre um certa presença da
divindade.5
A ascese moral deverá também ser acompanhada de uma
piedade que se manifeste em orações e atos de culto dirigidos a Deus, coerentes
com a vida, pois o culto meramente externo, quando desligado da ascese carece
de valor e não produz aquilo que se propõe, a união com Deus.6
Embora se possa fazer muitas oposições racionais ao
pensamento anti-cristão de Porfírio, deve-se reconhecer sua eloquência
literária e estilo atraente de leitura e algumas de suas afirmações,
consideradas em si mesmas podem trazer algumas luzes, do ponto de vista da
espiritualidade, ao cristianismo.
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