Emmanuel Mounier - O Personalismo (II)


Seguindo a lógica do resumo anterior, seguimos vendo os conceitos fundamentais que fazem dessa obra de Mounier, a carta magna do personalismo que marca a filosófica contemporânea.
A visão antropológica do autor permanece sendo a chave de leitura para a compreensão da obra, a pessoa é um ser espiritual, constituída com tal, a modo de subsistência e de independência de seu ser, ou seja, mantém sua subsistência graças a uma hierarquia de valores, a qual adere livremente e que busca viver empenhando-se responsavelmente. Nessa perspectiva, notamos que as características ontológicas essenciais da pessoa são: subsistência e independência do seu ser. Além disso, a pessoa tem uma dimensão fundamental que é dinâmica, ou seja, caminha em direção a um projeto ético. À par de tudo isso, na leitura atenta dessa obra, observamos que a pessoa humana constitui-se a si mesma seguindo uma tríplice dimensão fundamental, que é decorrente da própria compreensão antropológica do autor: vocação, encarnação e comunhão.
A vocação é o sentido que unifica toda a vida do homem, pois através dela, cada pessoa descobre o seu papel e missão fundamental no mundo. Tal vocação é sempre uma descoberta que deve ser feita em âmbito livre e pessoal e que, para tanto, exige meditação, reflexão existencial. “No recolhimento para encontrar-se, no desapegar-se para enriquecer-se novamente através da libertação da posse, a vida da pessoa – diástole e sístole – é que a busca até a morte de uma humanidade pressentida, desejada e que nunca se realiza.[4]
Além disso, justamente por ser incarnado, o homem não é totalmente auto-transparente e isso o deve fazer sair para fora de si mesmo, a fim de ocupar-se dos problemas do mundo a qual faz parte e não meramente como um sujeito passivo, mas como ativo, capaz de transformar a realidade e a vida daqueles que o cercam e que, em última instância, também fazem parte da sua auto-realização. Para fazer frente à própria condição exigente que a corporeidade lhe impõe, é necessário que a pessoa humana se confronte com os problemas do mundo a qual faz parte.
Como consequência disso, surge uma dimensão de comunhão essencial e operativa da pessoa humana em direção a sociedade-comunidade em que vive, e é somente na doação pessoal de si aos demais que o homem propriamente pode encontrar-se a si mesmo e para cumprir essa tarefa vocacional deve sempre reservar um momento de reflexão existencial de saída de si mesmo, cuja perfeição é justamente a vivência do amor. “O dado elementar, da experiência na comunicação, não é o estado mais possível ou mais universal, e sim o ato no qual me afirmo, expondo-me.[5]
A par de tudo isso, a segunda parte da obra, a presenta ainda as consequências sociais do personalismo. Podemos afirmar que Mounier, enfatizando a importância das relações interpessoais afirma a existência da pessoa humana como membro de um todo, que constitui propriamente um “nós”, uma vez que a sociedade é um agrupamento de pessoas, mas que tem a missão de transformar-se em comunidade através da personalização das relações humanas através do amor. Ou seja, em nível pessoal o que unifica a vida humana é a correspondência à própria vocação e em nível comunitário o amor.
O autor não apresenta sua teoria de forma ingênua, e enfatiza a importância de uma revisão das estruturas sociais, já que um personalismo efetivo necessita de atuação política, pois o “Estado é para o homem e não o homem para o Estado”.
Em minha opinião, o autor teve o mérito de chamar à atenção da reflexão filosófica a felicidade da pessoa humana enquanto tal. À par de especulações demasiadamente abstratas e meramente teóricas, o personalismo inaugurado por Emmanuel Mounier, coloca a pessoa humana no centro da reflexão, porem não o faz sob uma perspectiva subjetivista como diversos modernos e nem mesmo relativista como o faz tantos pensadores contemporâneos. O bem da pessoa humana não é subjetivo, antes é bem especificado enquanto conceito e como se realiza.
A leitura do texto proposto chama atenção também pela clareza, racionalidade e simplicidade dos argumentos e, ao meu ver, é de grande e imprescindível relevância filosófica atual, uma vez que o relativismo reinante, em nome de uma pseudo-liberdade, deturpou profundamente a concepção antropológica, o que é e como se realiza a felicidade humana.

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