São Tomás de Aquino - Summa Contra Gentiles (Cap I-IX)



A Summa Contra Gentiles foi escrita por São Tomás de Aquino nos últimos anos de sua vida e revela já a madurez de seu pensamento teológico-filosófico. Apresenta as teses fundamentais do grande gênio católico, que já haviam sido sinteticamente expostas em De Ente et Essentia e tem caráter apologético, dado o contexto em que foi escrita. Mostra como se deve enfrentar as outras religiões pelo confronto inteligente de ideias mais do que pela luta violenta das armas. Discute-se muito se é uma obra filosófica ou teológica,  a partir de outras leituras que realizamos ao longo de curso, eu afirmaria que é uma obra formalmente teológica com rigor filosófico, pois os principais mistérios da fé são analisados a partir do critério científico[1] da razão, o doutor angélico se apresenta verdadeiramente “como guia autorizado e insubstituível dos estudos filosóficos e teológicos.[2]
O autor apresenta suas teses fundamentais alicerçada na doutrina de Aristóteles, mas repensando-a, questionando-a e corrigindo-a através da Revelação, nota-se também que o angélico conhece profundamente os pensadores precedentes, pois aparecem direta ou indiretamente na obra, entre eles Platão, Cícero, Porfírio, Boécio, Avicena, Averróis em âmbito filosófico e Orígenes, Tertuliano, Gregório de Nissa Gregório Magno e principalmente Santo Agostinho em âmbito teológico. Especialmente nos capítulos 2 e 3 do livro I, vemos que o autor está exercendo o papel de sábio católico.
O livro I (cc.1-9), que nos propomos ler e analisar apresenta a Introdução do autor (cc. 1-2), a dupla ordem das verdades sobre Deus (cc. 3-5), a relação entre as duas ordens (cc. 6-8) e a divisão a ser seguida na obra (c. 9). Em resumo, estuda o conhecimento da razão natural no que concerne a Deus, o cosmos e o homem e que acidentalmente também pode ter sido revelado.
A introdução de Sto. Tomás revela também sua intenção, compete ao sábio ensinar a verdade e refutar o erro (c.1), o sábio cristão deve ensinar a Verdade e refutar o erro oposto, o que seguramente podemos afirmar fez a vida toda o santo, “portanto, como pertence ao sábio considerar principalmente o primeiro princípio (verdade que é origem de toda verdade) e discorrer sobre os outros, pertence-lhe impugnar também o erro contrário.[3]
Em seguida apresenta a dupla ordem das verdades divinas, a saber: a existência das verdades naturais e sobrenaturais (c.3) e a conveniência da revelação em dois âmbitos, o das verdades naturais (c.4) e o das sobrenaturais (c.5) A relação existente entre essas duas ordens de verdade mostra que as verdades sobrenaturais não são inconsistentes para a razão e não há contradição entre elas, pois a fé busca analogia nas verdades naturais, “embora a supracitada verdade de fé cristã exceda a capacidade da razão humana, os princípios que a razão tem postos em si pela natureza não podem ser contrários àquela verdade (…) esses princípios estão também contidos na sabedoria divina. Assim também, tudo que é contrário a eles contraria a sabedoria divina e não pode estarem Deus. Logo as verdades recebidas pela revelação divina não podem ser contrárias ao conhecimento natural.[4]
No cap. 9 apresenta o esquema geral a ser seguido em sua exposição: Deus, conhecido na ordem natural e também na ordem Sobrenatural a partir da revelação.
Em minha opinião, a obra revela não apenas a agudez e maestria do doutor angélico, como também uma atualidade impressionante, pois, como discutimos em aula, a atual dicotomia entre fé e razão é proveniente da incompreensão daquilo que é exposto nessa obra. Eu acrescentaria que o desconhecimento do que é objeto da fé e do que é objeto da razão, faz com que estas realidades pareçam opostas e inconciliáveis. Ainda que os últimos pontificados falem tanto o contrário, João Paulo II chegou a dedicar uma encíclica ao tema[5] e Bento XVI reflita constantemente tal relação.
A conciliação e compreensão da necessidade da razão para compreender e fazer crescer a fé continua sendo uma tarefa do verdadeiro filósofo cristão e nessa perspectiva eu ousaria em dizer que o filósofo do presente e do futuro é Santo Tomás de Aquino e que devemos lançar novas luzes sobre o seu pensamento e expor seu método e conteúdo com maior criatividade.





[1]Nao me refiro aqui a ciência em sentido positivista, e sim no sentido próprio do termo, como sabedoria: “a doutrina Sagrada trata de Deus modo muito próprio, enquanto Deus é a causa suprema, e não apenas ao que se pode dele conhecer mediante as criaturas (…) como também quanto ao que só Ele pode conhecer de si mesmo e comunicar por Revelação. Por isso, a doutrina Sagrada é a sabedoria por excelência.” cfr. S. Th. q. I, 1,7.
[2]PAULO VI, Carta “Lumem Ecclesiae”, n. 1 (20.11.1974)
[3]Summa Contra Gentiles, Liv. I, c. 1, 4.
[4]Ibidem, Liv. I, c. VII, 1-2.
[5]Fides et Ratio.





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