Santo Agostinho - O Livre Arbítrio

O livre arbítrio de Santo Agostinho traz como pano de fundo o problema da liberdade humana e a origem do mal moral, questões que o afligia desde a juventude, como se pode notar em Confissões. Sabemos que encontrou tal resposta no cristianismo. Impelido por amor apostólico não se contenta com isso e percebe a necessidade de demonstrar racionalmente esta verdade para os seus amigos extraviados, seja pelo erro, seja pela pura e impiedade.
Livre Arbítrio é a obra na qual o filósofo aborda racionalmente tais questões, o livro II é o coração da Obra, nele tenta provar três coisas através de um método ascensional: a) a existência da Deus é evidente[1]; b) Deus é a fonte de todo Bem, e não pode ser autor do mal[2], c) Deus é autor do livre arbítrio, que é um bem, pois dá ao homem a possibilidade de aderir a Verdade[3].
Da criatura mais perfeita ele chega ao Criador Perfeito. O ponto de partida é a constituição dos seres criados: existir, viver e entender, o único ser que pode fazer tal investigação é o homem, pois este possui essas três realidades e delas, a mais excelente é entender, pois aquele que entende possui as outras duas.
O caminho ascensional do filósofo fica evidente, no capítulo 7, pois parte do objeto dos sentidos exteriores (5 sentidos corporais), passa ao objeto dos sentidos interiores (razão) e demonstra como se relacionam entre si. A partir disso demonstra como o sentido interior é em si mesmo e como é juiz e guia dos sentidos exteriores. Demonstra uma clara hierarquia do ser e afirma que se há alguma realidade acima da razão, que seja independente dela, existente em si mesma e imutável, esta só pode ser Deus.
Para chegar à existência desta Verdade Universal Suprema (Deus), os números são apresentados como prova decisiva de que há uma verdade imutável e independente da razão, e, como tal, pode abrir acesso ao mundo inteligível e espiritual.
A eminência das propriedades da Verdade se revela nas leis dos números. Sua transcendência se revela à razão, a qual chega a conhecer suas propriedades, porém a Verdade é algo muito superior que a própria razão humana. E através dessa demonstração o santo conduz à existência de uma realidade tão sublime que só pode ser o próprio Deus.
A liberdade, criada por Deus, é o caminho para felicidade do homem e consiste na posse dessa Verdade Suprema e Absoluta. O livre arbítrio, desdobramento da liberdade, embora o permita abusar da dela, escolhendo o mal, só pode ser um bem, pois provém de Deus, fonte de todo bem e do qual não pode advir nenhum mal. Analogamente, da mesma forma que o mau uso dos seres corporais não impedem que os corpos sejam um bem em si mesmos, o livre arbítrio ainda que possa ser usado para o mal, permanece sendo um bem.
Assim resolve o problema do mal moral, que consiste numa inversão de bens, pois o homem deixa de escolher o Bem Supremo por um bem inferior, o que santo Agostinho afirma ser uma aversão a Deus para uma conversão à criatura.
Notei algumas características essenciais no pensamento de Santo Agostinho evidentes nessa obra, uma certa influência dos pitagóricos no que se refere a doutrina dos números[4], bem como sua influência Platônica, no que se refere à teoria da iluminação[5], ousaria dizer também influência aristotélica, pois quando fala dos atributos da Verdade parece aludir aos transcendentais. Notei também como ao fazer teologia não deixa de ser filósofo e ao fazer filosofia não deixa de ser teólogo, “crer para entender, entender para crer.”[6]




[1] Cap. 3-14.
[2] Cap. 15-17
[3] Cap. 18-20
[4] Cap. 8
[5] Cap. 9
[6] Cap. 8.

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