II. 4. O conteúdo do Bem Humano - Aristóteles


O CONTEUDO DO BEM HUMANO

I. ARISTÓTELES


      A ética de Aristóteles contém, sem dúvida, uma das primeiras e mais significativas investigações sobre o bem perfeito do homem ou felicidade.
     Em nosso curso seguiremos as grandes linhas de usa teoria da felicidade (edaimonia), exposta no livro I e nos últimos capítulos do livro X da Ética a Nicômaco.

1. A “edudaimonia”: contemplação, virtude e bens.

     A investigação aristotélica a respeito do conteúdo da felicidade humana parte de uma concepção finalista do agir humano. O que Aristóteles se pergunta é, portanto, qual é a atividade mais perfeita, a mais elevada e a mais excelente, a mais bela. Exclui que o prazer, a riqueza e as honras possam trazer felicidade ao homem, porque o homem deseja esses bens para serem felizes e não por eles mesmos

     A conclusão de sua investigação é que o bom por si mesmo é a vida conforme a razão virtuosa. Faz essa conclusão a partir de sua visão antropológica, pois o homem é um ser inteligente diferentemente das plantas e dos animais. Logo, o que faz feliz o homem é a perfeição da atividade segundo a razão.a essa perfeição ele chama por virtude.
    Aristóteles distingue duas dimensões da razão, a teórica e a prática, as quais correspondem aos dois tipos de virtude, as virtude morais (dianoéticas) e as virtudes éticas ou morais. A atividade mais alta é a contemplação teórica da verdade, uma vez que considera que são a virtudes intelectuais que dão ao homem a felicidade perfeita (teleía eudaimonia).
     Aristóteles fala também de um segundo tipo de felicidade, uma felicidade imperfeita, que consistiria na vida de quem regula a conduta segundo as virtudes éticas.
      É importante também considerar o que ele considera quando fala de contemplação. Não seria o que hoje fazem, por exemplo, os professores de filosofia (filósofos), a contemplação da qual fala não é uma atividade profissional caracterizada pela erudição ou agudez crítica, não é também somente um esforço intelectual e sim um consagrar-se por completo em percorrer o caminho ascendente através das causas e dos princípios tratados por ele em sua Metafísica.
      Por outro lado, Aristóteles reconhece que a vida puramente contemplativa seria demasiado excelente para o homem, pois enquanto tal seria incapaz de viver dessa forma, a não ser nele haja algo de divino.
      Aristóteles exorta a cultivar esse elemento divino e aspirar a imortalidade, mas a passar logo em seguida a falar em cultivar o segundo tipo de vida perfeita, a vida segundo as virtudes morais (justiça, fortaleza, etc).
      As virtudes éticas são hábitos adquiridos, que manifestam o equilíbrio da personalidade humana, a capacidade de escolher o que é bom e rechaçar o que é mal, o que permite integrar as tendências sensíveis em um gênero de vida harmônico informado pela razão e inclinado para a contemplação da verdade mais alta.
     Alcançar tal gênero de vida não é um dom da natureza e sim uma conquista meritória, que segundo o filósofo, poucos conseguiriam, pois a “maior parte dos homens vivem a mercê das paixões e do que é formoso e verdadeiramente agradável nem sequer têm noção.”
     A conclusão obtida até agora é que o bem ultimo ou felicidade do homem consiste na contemplação da verdade secundariamente na vida regulada segundo as virtudes éticas. Mas Aristóteles alerta que isso é verdade na medida somente em que ser feliz dependa de nós mesmos.
    A felicidade compreenderia também os ócios do homem livre, a felicidade das condições materiais de existência, tranqüilidade da alma, as amizades convenientes e uma atitude benévola da divindade para com os homens, “pois se alguma coisa outra coisa é dom dos deuses aos homens, é razoável que a felicidade também o seja, uma vez que é a melhor das coisas humanas”, afirma Aristóteles.
    Essa concepção só pode ser desenvolvida plenamente com o cristianismo, que Aristóteles não conheceu. Seu horizonte mental se caracterizava por uma visão harmônica e elitista entre o indivíduo e a pólis.

2. Qualificação de valores (valoração)

     A precedente exposição permite vislumbrar o valor e os limites da reflexão aristotélica acerca do bem humano. Seu valor está, em primeiro lugar, porque Aristóteles dá para sua investigação uma justa e metodológica direção. Como se diz hodiernamente, a ética aristotélica desenvolve coerentemente “o ponto de vista da primeira pessoa
    Um segundo motivo que torna valiosa a teoria aristotélica é porque consiste em vincular a felicidade perfeita na contemplação da verdade e especialmente, ao conhecimento de Deus.
    A inteligência é característica essencial, ainda que não a única, do ser do homem e seu estar no mundo e entre os demais homens. Compreender passa a pertencer a essência do ser e do viver do homem. Seu bem não pode excluir o conhecimento da Verdade.

    A razão é para ele o principal ordenador da vida pessoal e social do ser humano. Os fins das tendências humanas são verdadeiros bens enquanto buscados, possuídos e usados razoavelmente, tanto pelo indivíduo como pela coletividade.
   Com essas considerações sua concepção de felicidade humana se traduz em termos operativos concretos e o saber ético adquire uma estrutura básica que todavia ainda h9je conserva seu valor.
   As virtudes éticas são critérios racionais perfeitamente adaptáveis a pluralidade das situações concretas sem perder sua coerência essencial. Essa flexibilidade e amplitude permite ao pensamento de Aristóteles resistir ao tempo e às variações culturais e sociais.
    Essa esplêndida teoria sobre a felicidade no entanto, é insatisfatória, pois o próprio Aristóteles afirma que a felicidade perfeita não é alcançável. Os limites da felicidade aristotélica são insuperáveis numa perspectiva meramente filosófica e isso se dá principalmente pela sua concepção limitada a respeito de Deus.

    O Deus de Aristóteles não é o Ser e nem princípio do ser e sim a primeira substância, inteligência imóvel, seu Deus não alcança o coração humano e também não estabelece relação com o homem e também nega a capacidade de autotranscendência do homem.


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