I. 4. Ética pessoal e Ética política



          A moral, em sentido genérico, e a liberdade tem a mesma extensão. A vida privada, a vida profissional, econômica e política também são realidades morais. Assim, junto de uma ética, que poderíamos chamar pessoal, existe também a ética profissional, política etc.Todas são partes da ética. Nessa introdução a ética filosófica vamos nos deter na ética política e sua relação com a ética pessoal.
        A conduta pessoal se ordena sempre em vista do bem supremo ou fim último do homem. O que agora vamos analisar é se a ordenação ética da vida e as atividades da sociedade política visam o mesmo fim ou não.
       Num primeiro momento podemos entender a importância desse estudo quando refletimos que o desenvolvimento ético de uma pessoa pressupõe certas condições sociais e políticas, em função das quais o Estado pode exigir ou impedir coletivamente certos tipos de comportamento, por outra parte a liberdade pessoal de cada ser humano é um aspecto fundamental e inalienável de cada ser humano.
        Dessa reflexão entenderemos até que ponto vai o poder coercitivo do Estado, que constitui um problema extremamente delicado e que deve ser regido segundo critérios de justiça, de dignidade rigorosamente estabelecidos e cuidadosamente aplicados, pois do contrário grandes males são originados, tanto do ponto de vista pessoal, como do ponto de vista político.
      Uma maneira incorreta de entender essas relações é imaginar que a Ética política deve ser um cálculo exato da ética pessoal, o que equivaleria entender que o Estado deveria impor coercitivamente todas as normas da ética pessoal, exigindo o que esta considera bom e proibindo com sanções penais tudo o que constitui uma culpa moral.
      Não seria difícil imaginar os equívocos que isso causaria. A infração da liberdade pessoal de cada pessoa humana, além de uma fiscalização insuportável e até mesmo injusta. Além disso, seria transferir uma responsabilidade que, no fundo, é de cada pessoa ao Estado, o que impediria, em suma, a prática da virtude e da formação da consciência pessoal.
     Outra solução inadequada, e atualmente muito difundida, seria uma espécie de politização da ética. Seria o extremo oposto do que acabamos de refletir.
     Com o pretexto acabar com a intolerância essa visão tenta redefinir o objeto de estudo da ética, afirmando que ela deve ocupar-se estritamente das regras de justiça necessárias pra organizar a vida pessoal.
     Assim, a vida pessoal ou privada seria regulada por cada um segundo suas opções pessoais, das quais a ética não deveria ocupar-se. É uma espécie de relativismo moral, que no fundo, não admite uma concepção de virtude e de bem aplicável a todo ser humano. Essa visão expulsa da reflexão ética toda busca da Verdade sobre o bem humano, o que na prática resulta num conjunto de opções privadas igualmente válidas, ainda que muitas vezes contraditórias. Assim sendo, se tenho um cachorro, tanto faz se lhe quero furar os olhos ou não, desde que isso não prejudique ninguém, da mesma forma tanto faz se quero tirar a minha vida ou não, já que o valor que atribuo a ela cabe estritamente a mim.
     A politização da ética constitui hoje o principal obstáculo para a compreensão da ética pessoal, é o império do “faço da minha vida o que bem quero e me apraz”. A revolução francesa pregava a liberdade, igualdade e fraternidade muito subjetivamente, e em nome delas matou milhares de pessoas e sacrificando a liberdade pessoal de outras.
     Então qual seria a solução adequada?
     Sto Tomás de Aquino, ao comentar a “ética a Nicomaco” afirma que a Ética não é inteiramente política e nem inteiramente pessoal ou uma aplicação desta. O saber moral é uma totalidade unitária e coerente que contém diversas partes, e cada uma delas possui sua especificidade em nível de objeto formal, ou seja possui uma lógica própria.
     Ambas se relacionam da seguinte forma: cabe a ética política estabelecer, em vista do bem comum e ter em vista todas as circunstancias concretas, quais são os bens que devem ser tutelados(protegidos) e como devem ser protegidos, portanto definir quais sãos os comportamentos pessoais eticamente negativos e que devem ser impedidos e de que modo (sanções penais, econômicas, administrativas etc).
      Em suma, cabe a ética política definir a moralidade e a imoralidade das ações da comunidade política, por exemplo, verificar a imoralidade ou moralidade de uma lei civil, da atuação de um governo etc.
     
     Da distinção entre ética política e ética pessoal surgem as seguintes conseqüências:

1. Um mesmo comportamento não pode possuir uma dupla moralidade, ou seja, uma ação má em âmbito privado, como a mentira, não pode resultar numa ação politicamente boa, assim os fins não justificam os meios. Portanto, para promover uma lei boa, um político ou grupo político, não pode se itilizar de argumentos mentirosos. pois nunca um fenômeno pode ser analisado sob o mesmo aspecto pela ética política e pela ética pessoal, pois ambas possuem objetos formamente distintos.

2. No exercício de sua missão, a ética pessoal e a ética política, mantêm uma estreita relação recíproca. Assim sendo, a ética política não poderia estabelecer um valor moral sobre o consumo de drogas sem levar em consideração o que a ética pessoal tem a dizer. Da mesma forma a ética pessoal não pode determinar quais as obrigações de justiça sem conhecer as leis do estado a qual cada pessoal faz parte, uma vez que as leis civis justas obrigam moralmente uma pessoa.
3. Da mesma maneira que a sociedade política ordena-se ao bem de todas as pessoas que a compõem, a ética política depende da ética pessoal.

4. Para estabelecer que um comportamento deve ser penalmente punido pelo Estado não basta argumentar que é eticamente negativo, pois é reconhecido universalmente que nem todas as culpas morais sejam passíveis de sanções penais. Seria necessário refletir se tal ação má repercute necessariamente sobre o bem comum ou se sua tolerância não faça parte do crescimento moral da sociedade. (por exemplo, embora seja ruim que haja moradores de rua, não se pode simplesmente excluí-los da sociedade). Vale também afirmar que apesar de certas condutas morais não serem objetivamente punidas civilmente, isso não significa que sejam eticamente boas. (ex. união de homossexuais etc)


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