Entrevista concedida ao Jornal "The Washington Post" - Minha opinião pessoal, a respeito da renúncia do Santo Padre
>> quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013 –
PALESTRAS
Caríssimos irmãos e irmãs, ainda sob forte emoção, acabo de
retornar da Santa Missa de Imposição das cinzas na Basílica de S.
Pedro, onde depois de momentos de intensa oração e silêncio, quem
esteve presente testemunhou o Santo Padre ser aplaudido em pé, por
todos os presentes, entre risos e lágrimas emocionados durante mais
de cinco minutos, cessando somente a pedido do mesmo, para dar
prosseguimento à bênção Final da Santa Missa.
Não são poucos os que têm me ligado, escrito, perguntando minha
opinião a respeito do assunto, por isso resolvi registrar aqui no
blog, a entrevista que concedi ontem 12/02 ao jornal The Washington
Post.
WP: Como você recebeu a notícia da renúncia de Bento XVI?
Pe. Gilberto: Recebi a notícia como toda Igreja, com muita
surpresa e mesmo, um certo aperto no coração.
WP: O que você pensa a respeito?
Pe. Gilberto: Acredito que o Santo Padre agiu como um bom pai
de família, que pensando em primeiro lugar no bem de seus filhos,
reconhece que as limitações da vida o impedem de exercer a função
como gostaria e como a Igreja precisa. Penso que foi um grande gesto
de amor à Igreja e de coerência com sua história e legado.
WP: O Papa João Paulo II teve uma atitude bem diferente, e nos
últimos anos de seu papado estava notavelmente cansado e enfermo,
mas mesmo assim não renunciou, nessa perspectiva, não é
contraditório, que Bento XVI não tenha tido a mesma postura?
Pe. Gilberto: Eu penso que a atitude dos dois papas devem ser
vistas, julgadas e analisadas segundo o itinerário espiritual de
cada um e do momento que a Igreja vive em cada situação. João Paulo
II, fez a sua tese doutoral sobre a Fé segundo São João da Cruz, estava
plenamente convicto que era sua missão conduzir a Igreja ao
terceiro milênio, para ele unir-se a Cristo era imolar-se com Ele
até o fim no mistério do sofrimento, que marcou toda a sua vida
(perda da mãe, irmão e pai ainda na juventude, devastação de sua
Terra Natal pelo nazismo, depois pelo comunismo e o terrorismo, que
ele mesmo enfrentou na própria pele).
Bento XVI, é um homem da razão. Teólogo brilhante, pessoa simples,
de gestos simples, de uma afabilidade tamanha, como atestam todos
aqueles que tiveram a oportunidade de estar com ele pessoalmente,
como eu mesmo pude sentir em um momento inesquecível da minha vida.
Ao longo de todo o pontificado de João Paulo II, foi sempre o seu
colaborador mais próximo, confidente e conselheiro mais íntimo. O
substituto ideal para conduzir a Igreja depois de um grande Papa. Um
homem que jamais quereria atrair para si a força de forjar sua
personalidade simples e humilde. Bento XVI teve a identificação com
Cristo na imolação da própria vontade, serviço, oração
profunda, segundo sua próprias palavras.
Nessa perspectiva eu penso que devemos analisar as duas atitudes
diversas de dois homens santos e plenamente responsáveis e fiéis aos
desígnios de Deus. Bento XVI conduziu a Igreja em um dos períodos
mais delicados da contemporaneidade e deixou sua marca: a fidelidade,
a coragem, a clareza espiritual e a humildade de quem se reconhece
como humilde servo da vinha do Senhor.
WP. A Igreja vive tempos de crise (pedofilia, Vatileaks,
Legionários de Cristo etc), você acha correto o Papa deixar o cargo
neste momento?
Pe. Gilberto: A Igreja vive a crise oriunda do homem hodierno
e nesse sentido a Igreja sempre estará em crise, porque sempre
buscará responder aos anseios mais profundos do homem que clama por
sentido.
Bento XVI, em seu livro-entrevista Luz do Mundo, deixa claro, que em
tempos de crise, em tempos de turbulência, não se pode fugir, não se
pode deixar as dificuldades para que outro simplesmente as resolva.
Mas que em tempos de serenidade, um papa, se se reconhece sem
condições físicas, psicológicas e espirituais, tem o direito e
algumas vezes até o dever de renunciar. Eu penso que o Santo Padre
enfrentou essas questões de frente, com muita coragem, sensibilidade
e sobretudo fé. Recebeu pessoalmente várias vitimas dos abusos,
emitiu notas claras de repúdio a tais atos, recordou a doutrina da
Igreja a respeito do assunto, e sobretudo puniu os responsáveis, tenha-se em vista a demissão de mais de 80 bispos...
Agora penso que o momento é de serenidade, o que é bem diferente de
calmaria, que sinceramente creio que nunca houve e nunca haverá na
Igreja. O Papa visivelmente abatido pela idade e pelo peso do
encargo, consultando sua consciência diante de Deus diversas vezes,
se reconhece insuficiente nesse momento da história para continuar a
exercer o cargo de sucessor de Pedro. O que fazer? Na minha opinião
a atitude mais difícil, porém, mais correta e sincera é renunciar e
continuar a servir a Igreja de Cristo pela oração e pela entrega
fecunda e generosa do silêncio.
WP: Na América Latina, em especial no Brasil, há a expectativa
de que o próximo Papa possa vir de lá?
Pe Gilberto: Sem dúvida, existe uma expectativa a respeito do
próximo Papa, mas na América Latina, no Brasil ou em qualquer
parte do mundo, quem é católico de fato, não está preocupado se o
próximo papa será europeu ou africano, asiático ou latino, para nós
basta a certeza de que o Espirito nos dará o papa que a Igreja
precisa. Esperemos apenas que seja um homem de oração, atento aos
problemas da sociedade hodierna que colocou Deus em segundo plano e
que saiba nos dar o horizonte certo para realizar a vontade de Deus
expressa na Revelação.
Estou seguro de que o Papa Bento XVI se recolherá em uma vida de profunda
oração e silêncio e não pronunciará mais nem uma palavra a respeito
da Igreja e do mundo atual, para deixar o seu sucessor com plena
liberdade no exercício do Ministério Petrino.
Num mundo onde encontramos ditadores fazendo de tudo para conservar o
poder a todo custo, ainda que a doença e a idade imponham limites,
num mundo onde o golpe parece uma alternativa coerente para conservar
aquela vontade de poder de Nietzsche, Bento XVI demonstra sua fé. Na
Igreja de Cristo é diferente, quem a conduz é o Espirito Santo,
temos a Promessa de que as portas do inferno jamais prevalecerão
contra ela (cf. Mt 16,16). Será sempre Jesus Cristo, Sumo e Eterno
Pastor a conduzi-la.
Hoje, com voz cansada e lenta, com olhar profundo e emocionado, o
Santo Padre nos abençoa... o acompanhemos em nossas orações,
recomendando sempre ao Senhor aquele que o serviu com coerência e
amor durante toda a vida.
Clique aqui para ler o documento oficial de Renúncia do Papa Bento XVI
Clique aqui para ler o documento oficial de Renúncia do Papa Bento XVI
Padre Gilberto,
Excelente sua explanação!
abraços de união em Cristo
Helder
Melhor comentario sobre a renuncia do papa que li!
Eugenio Marcelo Lima