Entrevista concedida ao Jornal "The Washington Post" - Minha opinião pessoal, a respeito da renúncia do Santo Padre


Caríssimos irmãos e irmãs, ainda sob forte emoção, acabo de retornar da Santa Missa de Imposição das cinzas na Basílica de S. Pedro, onde depois de momentos de intensa oração e silêncio, quem esteve presente testemunhou o Santo Padre ser aplaudido em pé, por todos os presentes, entre risos e lágrimas emocionados durante mais de cinco minutos, cessando somente a pedido do mesmo, para dar prosseguimento à bênção Final da Santa Missa.
Não são poucos os que têm me ligado, escrito, perguntando minha opinião a respeito do assunto, por isso resolvi registrar aqui no blog, a entrevista que concedi ontem 12/02 ao jornal The Washington Post.

WP: Como você recebeu a notícia da renúncia de Bento XVI?
Pe. Gilberto: Recebi a notícia como toda Igreja, com muita surpresa e mesmo, um certo aperto no coração.

WP: O que você pensa a respeito?
Pe. Gilberto: Acredito que o Santo Padre agiu como um bom pai de família, que pensando em primeiro lugar no bem de seus filhos, reconhece que as limitações da vida o impedem de exercer a função como gostaria e como a Igreja precisa. Penso que foi um grande gesto de amor à Igreja e de coerência com sua história e legado.

WP: O Papa João Paulo II teve uma atitude bem diferente, e nos últimos anos de seu papado estava notavelmente cansado e enfermo, mas mesmo assim não renunciou, nessa perspectiva, não é contraditório, que Bento XVI não tenha tido a mesma postura?
Pe. Gilberto: Eu penso que a atitude dos dois papas devem ser vistas, julgadas e analisadas segundo o itinerário espiritual de cada um e do momento que a Igreja vive em cada situação. João Paulo II, fez a sua tese doutoral sobre a Fé segundo São João da Cruz, estava plenamente convicto que era sua missão conduzir a Igreja ao terceiro milênio, para ele unir-se a Cristo era imolar-se com Ele até o fim no mistério do sofrimento, que marcou toda a sua vida (perda da mãe, irmão e pai ainda na juventude, devastação de sua Terra Natal pelo nazismo, depois pelo comunismo e o terrorismo, que ele mesmo enfrentou na própria pele).
Bento XVI, é um homem da razão. Teólogo brilhante, pessoa simples, de gestos simples, de uma afabilidade tamanha, como atestam todos aqueles que tiveram a oportunidade de estar com ele pessoalmente, como eu mesmo pude sentir em um momento inesquecível da minha vida. Ao longo de todo o pontificado de João Paulo II, foi sempre o seu colaborador mais próximo, confidente e conselheiro mais íntimo. O substituto ideal para conduzir a Igreja depois de um grande Papa. Um homem que jamais quereria atrair para si a força de forjar sua personalidade simples e humilde. Bento XVI teve a identificação com Cristo na imolação da própria vontade, serviço, oração profunda, segundo sua próprias palavras.
Nessa perspectiva eu penso que devemos analisar as duas atitudes diversas de dois homens santos e plenamente responsáveis e fiéis aos desígnios de Deus. Bento XVI conduziu a Igreja em um dos períodos mais delicados da contemporaneidade e deixou sua marca: a fidelidade, a coragem, a clareza espiritual e a humildade de quem se reconhece como humilde servo da vinha do Senhor.

WP. A Igreja vive tempos de crise (pedofilia, Vatileaks, Legionários de Cristo etc), você acha correto o Papa deixar o cargo neste momento?
Pe. Gilberto: A Igreja vive a crise oriunda do homem hodierno e nesse sentido a Igreja sempre estará em crise, porque sempre buscará responder aos anseios mais profundos do homem que clama por sentido.
Bento XVI, em seu livro-entrevista Luz do Mundo, deixa claro, que em tempos de crise, em tempos de turbulência, não se pode fugir, não se pode deixar as dificuldades para que outro simplesmente as resolva. Mas que em tempos de serenidade, um papa, se se reconhece sem condições físicas, psicológicas e espirituais, tem o direito e algumas vezes até o dever de renunciar. Eu penso que o Santo Padre enfrentou essas questões de frente, com muita coragem, sensibilidade e sobretudo fé. Recebeu pessoalmente várias vitimas dos abusos, emitiu notas claras de repúdio a tais atos, recordou a doutrina da Igreja a respeito do assunto, e sobretudo puniu os responsáveis, tenha-se em vista a demissão de mais de 80 bispos...
Agora penso que o momento é de serenidade, o que é bem diferente de calmaria, que sinceramente creio que nunca houve e nunca haverá na Igreja. O Papa visivelmente abatido pela idade e pelo peso do encargo, consultando sua consciência diante de Deus diversas vezes, se reconhece insuficiente nesse momento da história para continuar a exercer o cargo de sucessor de Pedro. O que fazer? Na minha opinião a atitude mais difícil, porém, mais correta e sincera é renunciar e continuar a servir a Igreja de Cristo pela oração e pela entrega fecunda e generosa do silêncio.

WP: Na América Latina, em especial no Brasil, há a expectativa de que o próximo Papa possa vir de lá?
Pe Gilberto: Sem dúvida, existe uma expectativa a respeito do próximo Papa, mas na América Latina, no Brasil ou em qualquer parte do mundo, quem é católico de fato, não está preocupado se o próximo papa será europeu ou africano, asiático ou latino, para nós basta a certeza de que o Espirito nos dará o papa que a Igreja precisa. Esperemos apenas que seja um homem de oração, atento aos problemas da sociedade hodierna que colocou Deus em segundo plano e que saiba nos dar o horizonte certo para realizar a vontade de Deus expressa na Revelação.
Estou seguro de que o Papa Bento XVI se recolherá em uma vida de profunda oração e silêncio e não pronunciará mais nem uma palavra a respeito da Igreja e do mundo atual, para deixar o seu sucessor com plena liberdade no exercício do Ministério Petrino.
Num mundo onde encontramos ditadores fazendo de tudo para conservar o poder a todo custo, ainda que a doença e a idade imponham limites, num mundo onde o golpe parece uma alternativa coerente para conservar aquela vontade de poder de Nietzsche, Bento XVI demonstra sua fé. Na Igreja de Cristo é diferente, quem a conduz é o Espirito Santo, temos a Promessa de que as portas do inferno jamais prevalecerão contra ela (cf. Mt 16,16). Será sempre Jesus Cristo, Sumo e Eterno Pastor a conduzi-la.
Hoje, com voz cansada e lenta, com olhar profundo e emocionado, o Santo Padre nos abençoa... o acompanhemos em nossas orações, recomendando sempre ao Senhor aquele que o serviu com coerência e amor durante toda a vida.

Clique aqui para ler o documento oficial de Renúncia do Papa Bento XVI

Canjerana Alvim  – (15 de fevereiro de 2013 às 14:34)  

Padre Gilberto,
Excelente sua explanação!
abraços de união em Cristo
Helder

Anônimo –   – (27 de fevereiro de 2013 às 01:49)  

Melhor comentario sobre a renuncia do papa que li!
Eugenio Marcelo Lima

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