III Domingo da Quaresma
>> segunda-feira, 4 de março de 2013 –
HOMILIAS
Neste terceiro Domingo da Quaresma a liturgia
nos apresenta uma das imagens mais belas do Antigo Testamento, a sarça ardente,
na qual a presença do Senhor é demonstrada através de um fogo que arde sem
consumir.
Em
Toda a Sagrada Escritura observamos outras diversas manifestações da presença
do Senhor representadas através do fogo. Como os olhos de fogo do Messias
expresso pelo profeta Daniel e também por São Joao, no Apocalipse, quando vem
aos apóstolos através de línguas de fogo etc. Mas por que a Sagrada Escritura
apresenta o fogo como uma forma de presença de Deus ou da sua graça?
O
fogo é uma realidade da qual todos nós temos experiência. Já vimos e sentimos
os seus efeitos. Em outros tempos foi um dos elementos utilizados pelos
filósofos da escola Jônica para explicar a origem do cosmos, é ainda uma
realidade extremamente útil e necessária à vida humana. O fato é que tudo
aquilo que é submetido ao fogo não permanece igual, muda de forma e às vezes
também de substância, esquenta-se, ilumina-se etc.
Podemos
estabelecer um paralelo com a graça de Deus. Tudo aquilo ou todo aquele que que
se submete a ela também não permanece igual, se esquenta, se ilumina, adquire
nova forma, brilho! Nessa perspectiva podemos trazer este “fogo” da graça de
Deus para o centro da nossa meditação de hoje.
São
Joao da Cruz, ao nos falar da Noite
Escura apresenta-nos uma imagem muito bela de como esse processo se realiza
em nossa alma: quando o fogo se aproxima da lenha começa por iluminá-lo, dar-lhe
brilho, aquecê-lo. À medida que o tempo passa o lenho vai se tornando escuro,
vai perdendo suas características habituais, transformando-se. A princípio este
processo pode parecer um empobrecimento, do ponto de vista visual, mas depois,
se observamos com paciência, o lenho vai se misturando com o fogo, a ponto de
tornar-se brasa e mesmo ser confundido com o próprio fogo, de modo a não se
saber mais o que é brasa e o que é fogo.
Estou
convencido que é este o processo que se dá em nossa vida quando permitimos que
a graça de Deus nos envolva profundamente. Num primeiro momento ela nos aquece,
ilumina, dá brilho, com o tempo temos a impressão de nos empobrecer, e é
exatamente o que acontece, vamos nos empobrecendo de nós mesmos, das nossas
opiniões pessoais, gostos, manias, etc a ponto de às vezes não nos
reconhecermos mais. Mas se somos pacientes e sobretudo perseverantes, notamos
que uma grande obra de amor está ocorrendo em nossa vida. Com o tempo a
transformação é tão grande, a ponto de se nos confundirmos com Deus. Passa a
ser Ele a agir em nós e através de nós. “Fui crucificado com Cristo. Assim,
já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no
corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gl 2,20).
O
processo não costuma ser rápido e nem mesmo fácil, porém, o que conta
principalmente é a perseverança e, sobretudo, deixar que o “fogo” nos aqueça,
ilumine e depois nos faça brilhar no reino de Deus. Deixar Deus ser Deus,
procurar não impedir a sua ação em nossa vida, especialmente manter a vida
espiritual, sermos sinceros na direção espiritual e frequentes nos sacramentos
da penitência e da Eucaristia, eis o nosso empenho!
“Na
conversão e na calma está a nossa salvação, no abandono confiante está a nossa
força. O senhor nos espera para nos dar a graça” (cfr. Is 15, 18)
Não
devemos esquecer-nos também que o Senhor nos procura, espera de nós uma
resposta, e também encontrar frutos de apostolado e entrega em nossa vida como
ouvimos no evangelho da missa de hoje “(...) eis que três anos há que venho
procurando fruto nesta figueira e não acho. Corta-a: para que ainda ocupa
inutilmente o terreno?” (Lc 13, 8) Podem parecer palavras duras, porém
não são outra coisa que demonstração do grande interesse e amor que Deus tem
por cada um de nós. Não nos é indiferente e nem distante.
Caríssimos
irmãos e irmãs, especialmente neste período único da vida da Igreja e da
humanidade, não podemos estar indiferentes, como se o Senhor esperasse algo
apenas dos cardeais, na eleição do novo papa. Não! Cada um de nós temos a
responsabilidade de viver com fé este momento, de interceder, de oferecer cada
momento e circunstância da nossa vida em obra de amor, de entrega. Oferecer
também o nosso tempo de oração, unido à nossa penitência no cumprimento
ordinário de nossas ocupações. Rezar, amar, perdoar e servir.
A
virgem Maria intercede por cada um de nos e nos acompanha de uma forma singular,
como boa Mãe, não nos negará tudo aquilo que necessitamos para bem cumprir a
vontade Deus em nossa vida.
Deixemo-nos
aquecer, iluminar e abrasar pelas chamas do amor misericordioso do nosso Deus. “Bendizei
o Senhor, ó minh’alma. Não se esqueça de todos os seus benefícios” (Sl
102, 2).